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domingo, 14 de abril de 2013

XI ENCONTRO INTERNACIONAL DAS ENS - BRASÍLIA/DF - OS PONTOS CONCRETOS DE ESFORÇO E A PARTILHA (Mercedes e Álvaro Gomez-Ferrer Lozano)




Brasília, 23/07/2012 - 10:30h
















OS PONTOS CONCRETOS DE ESFORÇO E A PARTILHA

1.     A ESPIRITUALIDADE CONJUGAL E A SUA PEDAGOGIA

A descoberta da espiritualidade conjugal foi o grande contributo das Equipas de Nossa Senhora à Igreja para uma compreensão mais ampla e profunda do sacramento do matrimónio. Mas é de justiça reconhecer que também foi decisiva a pedagogia que a acompanhou e que transformou a intuição inicial em algo de concreto e real em que os casais se possam apoiar para crescerem e perdurarem.

Efectivamente, esta ideia revolucionária poderia ter ficado no seu enunciado teológico, como, por vezes, acontece no Magistério da Igreja, se não tivesse sido completada com a proposta de meios a utilizar de forma a encarná-la na vida.

Como é que os primeiros casais e o Pe. Caffarel descobriram essa pedagogia que edifica a
espiritualidade conjugal? Porque a marca de Deus está naquelas realidades terrenas que respondem ao seu “sim, quero”, ainda que seja apenas em gérmen, e esta convicção fê-los partir da antropologia, da própria vida. Foi uma descoberta indutiva e não dedutiva. Não foi, portanto, uma elaboração teórica, mas surgiu ao olhar, com admiração e ternura, os casais e o que eles procuravam viver, ainda que fosse de forma incipiente e imperfeita e precisasse de ser levado à plenitude.

Falar de espiritualidade conjugal e da pedagogia que lhe é própria é urgente nestes tempos que vivemos para se compreender melhor que o amor de um casal não é só um sentimento que parece estar condenado a uma inevitável caducidade.

O amor é uma adesão da vontade profunda de uma pessoa a outra pessoa, pondo em jogo tudo o que a pessoa é: a inteligência, as emoções, a sensibilidade, a criatividade, a vontade. Esse amor, que vai durar toda a vida, é como que a obra de arte de um artista que, para a atingir, passa por crises de expressão, por vezes até por uma noite escura dos sentidos. É uma coluna em torno da qual o homem dança, uma fonte da qual o homem bebe, um combate em que ambos se decidem, como dizia Santa Teresa de Ávila, a não desistir, a perdoar-se mutuamente, a recomeçar sempre.

O amor do casal assemelha-se àquelas bonecas russas, de que o Pe. Caffarel tanto gostava, que se vão abrindo e vão aparecendo uma dentro da outra. No fim, surge a última, a mais pequena, que nem por isso é a menos importante mas a que condensa tudo. Da mesma forma, na medida em que o homem e a mulher vão aprofundando a sua procura da verdade, do encontro e da vontade de Deus, cada um vai chegando ao seu eu mais profundo, e tudo muda quando esses dois “eu profundos” se relacionam a partir da comunhão.

O amor do casal humano mostra, melhor do que qualquer outra realidade terrena, como é o amor de Deus pelos homens. O Pe. Caffarel descreve-o neste belo texto à maneira de Péguy:
Casal humano, minha bem-amada criatura, minha testemunha privilegiada, compreendes agora por que me és tão querido entre todas as criaturas?
Compreendes a esperança imensa que deposito em ti?
És portador da minha reputação, da minha glória, és para o universo a grande razão de esperança, porque tu és o amor.

2.                 A TRIPLA PROCURA QUE NOS É PROPOSTA PELOS PONTOS CONCRETOS DE
ESFORÇO

O amor conjugal é um sinal do amor de Deus e, no entanto, paradoxalmente, não há amor mais vulnerável. O amor aos filhos suporta tudo. O amor conjugal precisa de cuidados contínuos, daquela pedagogia de que vamos falar e que é um tesouro que as Equipas oferecem. Tendo trabalhado muito na Pastoral Familiar em Espanha e pertencido ao Conselho Pontifício para a Família, tivemos oportunidade de conhecer muitos movimentos conjugais e familiares, e podemos dizer-vos que, havendo nas reuniões mensais muitas semelhanças entre todos, nenhum deles tem essa pedagogia dos Pontos Concretos de Esforço que, na vida quotidiana e ao longo do mês, constitui a espiritualidade conjugal e que partilhamos no momento da Partilha.

Qual é o sentido que está por trás dos Pontos Concretos de Esforço, e qual é o espírito que os
torna actuais e válidos para o futuro?

Nas Equipas não se escolhem acções de forma arbitrária nem ninguém se mentaliza através de um mero voluntarismo; antes somos chamados a reflectir e a encontrar as razões do que nos propõem. Talvez fosse mais fácil incorporá-los na nossa vida se os compreendêssemos melhor.

Vamos procurar apresentar-vos, de forma muito breve, o que nos pareceu descobrir a respeito deles num clima de oração e de escuta aí pelo ano de 1990 e que descrevemos no documento sobre a Partilha.

a) Os Pontos Concretos de Esforço são atitudes interiores a despertar, atitudes de vida a assimilar, na gradualidade e na personalização.

É por isso que são designados utilizando infinitivos e não imperativos: “escutar”, “reservar”, “encontrar-se”, “fixar-se”, “colocar-se”.

Não são coisas que nos são impostas a partir de fora. São um apelo interior a um esforço pessoal e de casal, um esforço de realismo e de perseverança que abarca toda a nossa pessoa. Um esforço a que nos obrigamos, individualmente e os dois juntos, a partir de uns mínimos, para irmos aprofundando, com verdade e com exigência, um caminho de conversão que não tem como limite senão a santidade.

Nem mais nem menos.

O amor precisa que o recordemos, o celebremos, o tornemos presente, caso contrário apaga-se, esmorece e morre — o que conseguimos graças a pequenos “ritos de encontro” que cada casal inclui na sua vida, que nos aproximam, actualizam datas, encontros, recordações, músicas e palavras, que nos reservam pequenos espaços de tempo e de silêncio. Da mesma forma, uma vida cristã sem “ritos de encontro” destinados a actualizar em nós o amor e a presença de Deus dilui-se, perde coesão, não se transforma, não cresce. A pessoa simplesmente “deixa-se viver”.

b) Nos Pontos Concretos de Esforço não há dispersão nem arbitrariedade. Estes pontos têm
uma coerência interior que se encontra também em toda a metodologia das Equipas, a todos os seus níveis, uma lógica que os encadeia, objectivos que os integram uns nos outros. As atitudes constantes que os Pontos de Esforço pretendem ir despertando em nós são fundamentalmente uma procura tripla, um apelo triplo.

1– Verdade.

Um apelo a desenvolver a capacidade de viver a partir da verdade e na verdade:
“verdadeiro encontro com o Senhor” (oração), “verdadeiro diálogo conjugal” (dever de se sentar), “uma regra para a vida” (a regra de vida).

2– Encontro. Um apelo a aumentar a possibilidade de encontro e, portanto, de comunhão entre
nós:
“escutar” (leitura da Palavra), “encontro com o Senhor” (oração), “encontrarem-se marido e
mulher” (oração conjugal), “em casal” (retiro).

3– Vontade de Deus. Um apelo a abrir-nos para descobrirmos a vontade de Deus para a nossa
vida:
“a palavra de Deus” (leitura), “sob o olhar de Deus” (dever de se sentar), “planear a vida diante
do Senhor” (retiro).

Para assimilar atitudes é necessária uma certa assiduidade, pois só a repetição nos exercita, nos dá força, nos mantém em tensão. Por isso, também nos é indicada a frequência: “assiduamente” (leitura da Palavra), “cada dia” (oração conjugal), “cada mês” (dever de se sentar), “todos os meses” (regra de vida), “cada ano” (retiro).
É também um apelo ao agradecimento. No nosso tempo livre, no que é nosso e no que reservamos sempre para nós, deixamos que o outro, e, ainda mais, que o absolutamente Outro, tenha um lugar.

3.     QUE É A PARTILHA?

A Partilha é um esforço conjunto de entreajuda espiritual para avançar num caminho comunitário de conversão. A comunidade não existe pelo simples facto de um grupo de pessoas se reunir. A comunidade pode criar-se e pode destruir-se. Cria-se quando se partilha de verdade a vida, quando partilhamos com os outros esse dom de Deus que recebemos.

Esta partilha tem lugar durante toda a reunião; começa com o jantar, continua com o pôr em comum, aprofunda-se no tema de estudo, intensifica-se no tempo de oração, mas no momento da Partilha procura um objectivo muito profundo. Embora a semelhança das duas expressões “Partilha” e “Pôr em comum” possa confundir algumas pessoas, é conveniente mantermos a terminologia adoptada pelo Movimento há mais de 60 anos. A Carta faz a distinção entre o “pôr em comum” das preocupações familiares, profissionais, cívicas, eclesiais, dos êxitos e dos fracassos, das dores e das alegrias, e a “Partilha” sobre aquilo a que então se chamava “obrigações” e hoje são os Pontos Concretos de Esforço. A realização do Pôr em comum constitui uma condição necessária para se chegar de maneira verdadeira e profunda à Partilha.

A Partilha é o momento da reunião em que cada um acolhe o ser do outro no seu sentido mais
profundo: o de partilhar o seu projecto cristão, o seu itinerário de conversão, realizando assim um sinal real de que somos, com os outros, um em Cristo, de que a equipa quer ser  comunidade santa e sabe que cada casal tem parte da responsabilidade nessa santificação, responsabilidade a que não pode eximir-se senão em prejuízo do conjunto.

No entanto, é verdade que cada casal parte de uma determinada situação, tem as suas dificuldades, um ritmo diferente, capacidades e “talentos”. Ninguém é melhor do que outro, mas também não há quem não possa ir fazendo frutificar o que recebeu.

Por que é que a Partilha é tão difícil?

– Em primeiro lugar, porque, quando, na reunião, partilhamos sobre os Pontos Concretos de Esforço, damo-nos conta das nossas fraquezas, dos nossos defeitos, da repetição das nossas omissões, e isso dói e custa a aceitar. Dizer em voz alta, reunião após reunião, “não fiz”, “não tivemos tempo”, “pensei nisso, mas...” coloca-nos diante da diferença que existe entre o que dizemos e o que realmente fazemos, a distância que medeia entre as palavras resignadas e o que é o tecido real da nossa vida.

– A segunda coisa que nos acontece é que formulamos mal as perguntas e as respostas da Partilha. Em vez de “fizemos” ou “não fizemos”, a que se segue o silêncio indiferente ou até desaprovador dos outros, deveríamos fazer as perguntas que contam, as que vão ao fundo e que fazem com que nos digamos a partir da verdade.

Vamos enumerar algumas perguntas possíveis.

– Escutar a Palavra não é só ler, é algo mais, é saborear, ler nas entrelinhas, como se lê uma
carta de amor: Que descobri sobre Cristo ao escutar a sua Palavra? Que tipo de resposta provocou em mim? Essa Palavra iluminou alguma situação da minha vida este mês?

– A oração pessoal é um encontro dialogal Eu - Tu, não um encontro connosco próprios. Como
consigo estabelecer esse diálogo? Em que momento do dia? Que tipo de oração faço: leitura espiritual, com as palavras litúrgicas, de petição, de meditação...? Consigo fazer silêncio em mim?

– Dizem-nos que a oração conjugal é um encontro entre “marido e mulher”. Damo-nos conta de que o mais importante na oração conjugal não é tanto a oração em si mas o facto de, juntos, mesmo se zangados ou afastados, nos dirigirmos ao Senhor para que Ele active as graças do nosso sacramento? Que método seguimos? Alguma vez sentimos se essa oração cura as nossas feridas?

– O dever de se sentar é um diálogo e, por isso, ambos falam e ambos escutam, e é um diálogo verdadeiro em que cada um se esforça por não manipular nem enganar o outro. Que sinal utilizamos como presença de Deus? Tem-nos sido possível comunicar e encontramo-nos? Sentimo-nos mutuamente acolhidos? Somos capazes de reconhecer a nossa quota-parte de culpa nas situações de conflito? Temos dito um ao outro também algo de bom? Que progressos temos feito?

– A regra de vida é um trabalho pessoal de procura de mais verdade que deve redundar em benefício dos outros. Que aspecto da minha personalidade tenho trabalhado na regra de vida?
Como o escolhi? Que pistas me levaram a detectá-lo? Os outros membros da equipa poderiam
ajudar-me a ver com mais clareza a minha regra de vida?

– No retiro, muito mais importante do que o padre que o prega somos nós, é a nossa atitude de
reflexão e de encontro, e para isso há que dedicar tempo suficiente. Que descobrimos sobre a vontade de Deus no último retiro? Que é que nos impressionou mais? Com que sentimentos acabámos o retiro? Em cada reunião, bastaria que cada casal se cingisse apenas a uma destas perguntas sobre aquele Ponto Concreto de Esforço que nesse mês foi para ele descoberta de mais verdade, motivo de encontro ou indicação da vontade de Deus. O resto da equipa escuta o que cada casal vai dizendo, com o espírito e o coração abertos, atentos e compreensivos através do olhar, activos e acolhedores através da posição do corpo.

4.     O ESFORÇO E A GRAÇA

Aqui estão casais de muitos países e de muitas culturas; casais com uma pilotagem recente que se descobrem com alegria na reunião de equipa, casais que venceram o desencanto da rotina com criatividade e continuam na brecha com maior formação, com uma grande amizade entre si e com uma vida familiar plena, casais que prestam um serviço ao Movimento ou estão empenhados na Igreja, casais que continuam fiéis e unidos apesar dos anos e que acompanharam algum membro da sua equipa na sua passagem para uma Vida nova, viúvos e viúvas que se sentem membros da equipa em que o outro continua a estar misteriosamente presente e conselheiros que são amigos, companheiros e mestres. Pela vossa proximidade à realidade conjugal, puderam compreender que o ensino da Igreja deve ter em conta não só as necessidades dos casais mas também o que eles descobrem sobre o seu amor, a sua espiritualidade e o seu sacramento. Unidos, conselheiros e casais, conseguimos uma maior fecundidade espiritual.

Queremos partilhar convosco a imagem que escolhemos para a caminhada da nossa própria equipa.

“Somos seis casais e um celibatário. Subimos para um barco porque estamos todos interessados em chegar a essa “outra margem” que se vislumbra ao longe, no horizonte. Não sabemos muito da arte de navegar nem de instrumentos de navegação, mas vamos com entusiasmo e alguma incerteza. O lago refulge como uma promessa. De momento não há vento e o sol brilha, mas intuímos que nem sempre será assim, que haverá dias de nevoeiro, que haverá temporal e haverá tempestade. Há outros barcos próximos que também se preparam, como nós, para a travessia. Disseram-nos que um timoneiro nos acompanha, embora não o vejamos. Falaram-nos do seu amor pelos que viajam, e que esse amor lhes assegura o consolo da sua presença. Isto não nos dispensa de olhar bem para o mapa, de verificar os instrumentos, de usar as velas, de atribuir a cada um uma tarefa na navegação, consoante as suas qualidades.

Qual é o nosso objectivo? Queremos ir juntos neste pequeno barco e alcançar a “outra margem”, que recebe também o nome de Verdade e que tanta gente pretende alcançar. Cada um de nós tem-se dado conta de que, embora tratando-se de uma única Verdade, foi tão repartida ao chegar à terra que não a descobriremos totalmente se a procurarmos sozinhos. Se caminharmos com outros, esses outros servem-nos de espelho, e o seu reflexo devolve-nos a nossa verdade acolhida, matizada, completada.

No nosso barquinho, Luís olha o mapa e interroga-se sobre aquilo em que ninguém pensa mas acerta. Pilar faz-lhe de contrapeso porque é mais realista. Margarita apoia os movimentos de Guillermo e Guillermo os de Margarita, e assim ambos estabilizam o peso. Antonio y Amparo orientam a vela para que receba o máximo de vento. Mercedes vai cantando enquanto prepara o almoço e Álvaro perscruta o horizonte com os binóculos. Paco e Maiju seguram o mastro grande para não cair na cabeça de ninguém. Trini e Juan, que se juntaram a nós no barco, apoiam-nos a todos. Federico, Carlos e Jovi verificam o rumo e vão animando a tripulação.

O tempo vai passando e, a pouco e pouco, percebemos que essa “outra margem” não é senão o oceano que se perde no infinito e, ao mesmo tempo, descobrimos que a Verdade era o Amor e que a Verdade era a Fé e que a Verdade era a Esperança. E é para essa Verdade que se funde com o mar que orientamos de novo o rumo, com o coração ardente, e muitos outros barcos vêm também dos quatro pontos do horizonte.

Esta é mais ou menos a história da nossa equipa que já navega há quarenta e seis anos e que orienta o seu leme para a eternidade”.

Não desanimemos se não conseguimos assimilar as atitudes que os Pontos Concretos de Esforço nos propõem. É certo que não é fácil, falta-nos tempo e assiduidade, somos dois e tão diferentes... Além disso, pedimos demasiado ao amor conjugal, e toda a realidade humana está ferida pelo pecado na sua própria raiz. Também esperamos demasiado do outro, que, como nós, é uma pessoa limitada.

6 Os anos vão passando com muito poucos êxitos, mas mantemo-nos à tona como o barquinho de que falámos antes; navegamos e deixamo-nos levar, esforçamo-nos e ficamos parados embora sem amarras. O importante é que trabalhemos e, ao mesmo tempo, estejamos abertos, flexíveis, maleáveis.

Esperar não é instalar-se, é avançar porque sabemos que o que procuramos ainda está para chegar. E pode chegar de modo inesperado e totalmente imerecido. Não é à força de sacrifícios que conseguimos viver da Vida de Deus. Só a sua Graça o torna possível.

O tempo mede-se de forma muito diferente para Deus e para o homem. Para nós, um momento de graça pode parecer muito breve em comparação com a duração de uma vida terrena. Para Deus, um instante de graça pode ter um valor de eternidade. O importante é acolher a sua graça em algum momento da vida, mantidos na espera finalmente deixámo-nos amar por Ele. Recordemos a história do ermitão que sonhara que estava diante da porta de bronze do Paraíso e, desejando encontrar-se com o Senhor, batia e batia com violência, mas a porta não se abria. Gritava, empurrava com toda a força aquela porta que permanecia fechada e acabou por adormecer, como o cão que espera à porta do dono. De repente, foi acordado por um raio de luz. A porta estava a abrir-se do interior. Empurrando-a para dentro com toda a força, a única coisa que tinha conseguido era impedir que ela se abrisse. Enquanto dormia, o Senhor tinha delicadamente aberto a porta para fora, para ir ao encontro do seu filho e talvez di
zer-lhe: “Se alguma vez me deixasses a possibilidade de ser o protagonista, dar-te-ia com doçura, de forma inesperada, o que procuras tão encarniçadamente”.

5.     TODO O DOM É UMA VOCAÇÃO

A 25 de Março de 1973, numa conferência aos responsáveis de sector em que anunciava a sua retirada da responsabilidade das ENS e reflectia sobre o seu futuro, o Pe. Caffarel dizia duas coisas que nos parecem essenciais:

A primeira, que nunca haverá uma verdadeira renovação num Movimento se não se for fiel ao
carisma do início, se não se reencontrar o dinamismo interno, o impulso do entusiasmo inicial.
Também temos de aplicar isto ao reflectir sobre a pedagogia.

A segunda, que desde o princípio a grande pergunta foi: que é o amor? Não há dois amores. Se conhecermos melhor o amor humano, conheceremos melhor o amor de Deus, e vice-versa.
“Penso, disse o Pe. Caffarel nessa conferência, que esta meditação sobre o amor nunca deve ser interrompida, porque é a única realidade que existe; Deus é Amor, o homem é amor. Não compreendemos nada se nos situarmos fora do amor”.

O que recebemos nas ENS é um dom: o sentido profundo do amor humano, a sua espiritualidade, a sua pedagogia, a possibilidade de nos formarmos, de rezar, de nos ajudarmos mutuamente em equipa, o testemunho e o serviço de outros casais, a amizade, a preparação e o tempo dos conselheiros espirituais...

São tantas as coisas que gratuitamente nos são dadas que quando pensamos nelas ficamos oprimidos pela responsabilidade. Nada disto pode ficar enterrado em nós mesmos nem no resguardado reduto da equipa. De facto, pelo seu próprio dinamismo, todo o dom tende a expandir-se, a comunicar-se, porque todo o dom é uma vocação, um chamamento, uma missão.

Não há exclusão. Somos chamados a SER, no sentido mais profundo possível, e a integrar tudo o que somos: espiritualidade e compromisso, contemplação e acção, casal e mundo, pequena comunidade e Igreja universal, chamamento e resposta.

Se desde os primeiros tempos do Movimento isto já estava bem claro, e com diferentes formulações se foi repetindo ao longo da história das Equipas, estamos hoje perante um momento particularmente urgente. Por isso, a orientação deste Encontro resume-se em dois verbos imperativos e de acção: “Vai e faz”. Como sujeito, encontramos um pronome pessoal na segunda pessoa, “tu”, que nos impede de nos escudarmos atrás de outros casais, da equipa, do sector, nem sequer do Movimento, que nos interpela directamente, “tu”, cada um, cada casal. O que nos é proposto é fazer “o mesmo”, o que fez o samaritano com o ferido que encontrou no caminho, “o mesmo” com tantos “feridos” que encontramos na vida, em especial “os feridos no amor conjugal”. “O mesmo” é o que não estava programado mas é inevitável, o que o amor dita, embora contenha riscos, o que não tem em conta as justificações que a razão apresenta, o que só se vê e só compromete se nos deixarmos mover pela compaixão.
Queridos amigos, ao lado uns dos outros, animando-nos mutuamente, só a partir de uma
espiritualidade mais profunda e verdadeira poderemos fazer “o mesmo”.

Alvaro e Mercedes Gómez - Ferrer Lozano


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